“Vivendo no centro de Moscou, você não pode conhecer a
verdadeira situação do país. Teria de deslocar-se às províncias, manter
estreitos vínculos com as pessoas, compartilhar seus desejos, trabalhos e
calamidades; com os esfomeados – adultos e crianças – suportar os
inconvenientes sem fim que impedem a obtenção de provisão para um mísero
lampião … E as conclusões a que chegaria, poderiam ser resumidas numa só: a
necessidade de abrir caminho para condições de vida mais normais. Se não o
fizermos, esta situação nos conduzirá a uma sangrenta catástrofe. Nem as
locomotivas dos aliados, nem a exportação de trigo, algodão, cobre, linho ou
outros materiais dos quais temos enormes necessidades poderão salvar a
população.
Em vez
disso fica uma verdade: ainda que a ditadura de um partido constituísse um meio
útil para combater o regime capitalista – o que duvido muito – esta mesma ditadura seria totalmente nociva
para a criação de uma ordem socialista. O trabalho, necessariamente, tem de
constituir-se na base das forças locais, mas até agora, isto não ocorre nem é
estimulado por nenhum lado. Em seu lugar se encontram, a todo instante,
individualidades que desconhecem a vida real e cometem os maiores erros,
ocasionando a morte de milhares de pessoas e arruinando regiões inteiras.
Sem a
participação das forças locais, sem o trabalho construtivo de baixo para cima,
executado pelos trabalhadores e todos os cidadãos, a edificação de uma nova
vida é impossível.
Uma obra semelhante poderia ser empreendida pelos sovietes, pelos conselhos
locais. Mas a Rússia, devo enfatizar, é uma república soviética apenas no nome.
A influência e o poder dos homens do partido, que são frequentemente estranhos
ao comunismo – os devotos da ideia estão sobretudo instalados aí no centro –
têm aniquilado a influência verdadeira e a força daquelas instituições que muitos
prometiam: os sovietes, repito: não há mais sovietes na Rússia, mas somente
comitês do partido que fazem e desfazem. E as suas organizações padecem de
todos os males do funcionalismo.
Para sair da desordem atual a Rússia deve retomar o espírito criador das forças
locais que, asseguro, são as únicas capazes de multiplicar os fatores de uma
nova vida. Quando antes se compreender isto, melhor! As pessoas se disporão a
aceitar mais facilmente as novas formas de organização social. Entretanto, se a
situação atual se prolongar, a mesma palavra socialismo se converterá numa
maldição, como ocorreu na França com a ideia igualitária durante os quarenta
anos que seguiram ao governo dos jacobinos.”
Piotr Kropotkin – Dimitrov, 04 de março de 1920
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